Por Gilberto Natalini e Ulysses Francisco Buono
Historicamente, a humanidade tem se posicionado como uma entidade separada e dominante sobre a natureza, explorando seus recursos de forma intensiva. No entanto, essa perspectiva tem levado a desequilíbrios ecológicos significativos, o que nos obriga a reconhecer que somos parte integrante do meio ambiente e que a nossa saúde e bem-estar estão intrinsecamente relacionados à manutenção dos ecossistemas.
As mudanças antrópicas têm intensificado a ocorrência de eventos climáticos extremos, como ondas de calor, enchentes e secas, que impactam diretamente a saúde da população. Estudos indicam que 58% das doenças infecciosas conhecidas são agravadas por eventos climáticos extremos, devido ao aumento da proliferação de vetores e à contaminação de recursos hídricos. No Brasil, entre 2020 e 2023, o número de pessoas adoecidas devido a desastres naturais e eventos extremos aumentou de 54 mil para 157 mil, evidenciando a crescente vulnerabilidade da população.
Adicionalmente, em 2022, a OMS estimou que mais de 13 milhões de mortes em todo o mundo a cada ano são resultado de causas ambientais evitáveis. Essa constatação permite concluir que um meio ambiente enfermo é muito prejudicial à saúde do ser humano, razão pela qual, é necessário maximizar os esforços, a fim de preservá-lo e mantê-lo em boas condições.
Pelo constatado, podemos observar como a diligência ou a negligência com o meio ambiente podem afetar diretamente a saúde humana. Diversas doenças e comorbidades que os profissionais da área da saúde referem podem estar relacionadas à degradação ambiental, tais como: doenças respiratórias, infecciosas e gastrointestinais. Diante dessa constatação, como devemos enfrentar e integrar saúde e meio ambiente?
Neste sentido, o funcionalismo público desempenha um papel fundamental na implementação e execução de políticas que integram saúde e sustentabilidade. Profissionais de diversas áreas, como saúde, meio ambiente e defesa civil, são essenciais na elaboração de estratégias de prevenção, na resposta a emergências e na educação da população sobre práticas sustentáveis.
Um exemplo disto, é o Sistema Único de Saúde (SUS), instituído pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado pela Lei nº 8.080/1990, sendo um marco na promoção da saúde pública no Brasil. Essa legislação reconhece que a saúde é influenciada por diversos fatores determinantes e condicionantes, que incluem: alimentação, moradia, saneamento básico, meio ambiente, trabalho, renda, educação, atividade física, transporte, lazer e acesso aos serviços essenciais. Essa abordagem ressalta a importância de políticas públicas intersetoriais que integram saúde e sustentabilidade.
Já o programa "São Paulo Sempre Alerta", uma iniciativa em nível estadual, visa articular ações intersetoriais para fortalecer a infraestrutura preventiva e a segurança da população. A Secretaria de Estado da Saúde capacita equipes para lidar com os efeitos desses eventos, prevenindo surtos de doenças e garantindo o abastecimento de insumos essenciais.
Investir em infraestrutura sustentável – como o saneamento básico – também é uma estratégia eficaz para a promoção da saúde pública. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS, 20144), para cada dólar investido em saneamento básico, economiza-se US$ 4,30 em custos com saúde.
A relação entre saúde e meio ambiente exige uma abordagem integrada e sustentável nas políticas públicas. O fortalecimento do SUS, aliado a investimentos em infraestrutura sustentável e à atuação proativa do funcionalismo público, é vital para mitigar os impactos dos eventos climáticos extremos na saúde humana. A adoção de práticas sustentáveis e a promoção da equidade social são caminhos essenciais para garantir a resiliência das comunidades frente às mudanças climáticas e para assegurar a saúde e o bem-estar das futuras gerações.
Portanto, cabe a nós decidir racionalmente o que é melhor. Enfrentar as nefastas consequências de nossas escolhas equivocadas até este momento, inclusive para as gerações futuras, ou assumir a responsabilidade que nos cabe para garantir um meio ambiente saudável e, por conseguinte, mitigar os riscos para a saúde humana?
Gilberto Natalini é coordenador de Meio Ambiente da AFPESP, médico gastrocirurgião e ambientalista. No setor público destacou-se como secretário do Verde e do Meio Ambiente e secretário executivo de Mudanças Climáticas da cidade de São Paulo. Eleito vereador de São Paulo pela primeira vez em 2000, cumpriu o seu quinto mandato até 2020. É autor de 419 projetos de leis e tem 147 leis aprovadas. Suas principais bandeiras de vida são a democracia, o desenvolvimento sustentável, maior equidade social e a moralidade pública.
Ulysses Francisco Buono é coordenador de Assistência à Sáude. Atuou como médico gerente geral da Interclínicas durante duas décadas e como consultor do diretor de saúde da Porto Seguro por 11 anos. Graduou-se pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo em 1971 e concluiu residência médica pediátrica em 1973.