De modo a esquecer definitivamente que 2021 não passa de um 2020 parte II, trago uma excelente notícia a respeito dessa doença: segundo a American Cancer Society (ACS), uma das entidades mais importantes e referência mundial sobre o tema, entre 2017 e 2018, houve redução de 2,4% na mortalidade global por câncer. Esta é a maior queda já documentada pela entidade. A análise dos dados ainda nos permite concluir algo extraordinário: de 1991 a 2018, a mortalidade global por câncer caiu 31%.
Isso significa que 3,2 milhões de mortes foram evitadas neste período!
Em linhas gerais, é possível dizer que o câncer é o resultado de mutações genéticas que, entre outras coisas, sucedem na multiplicação desordenada das células.
Então, quer dizer que se eu tenho uma predisposição nos meus genes, estou “condenado” a ter a doença? É tudo uma questão do acaso, de sorte em ter ou não ter?
Felizmente, a resposta é não!
Alterações genéticas que levam ao câncer também podem ser causadas pelos nossos hábitos!
Estima-se que apenas 15 a 20% da probabilidade possam ser atribuídos à genética. Ou seja, nossas atitudes são responsáveis por 80 a 85% das chances de desenvolver algum tipo de câncer, sendo, portanto, muito mais importantes e determinantes no processo que termina (ou não) em um tumor.
Assim, tão importante quanto os chamados “exames de rotina” ou “check-up”, é a consulta de rotina com o seu médico(a), seja ele(a) generalista, ginecologista, geriatra ou de outra especialidade.
Consultas e exames de rotina
A consulta gera a oportunidade de solucionar dúvidas, solicitar exames complementares, receber orientações e estímulo quanto aos hábitos capazes de prevenir a doença antes de esta vir a apresentar complicações, afetar nossa qualidade de vida e exigir tratamentos mais caros e invasivos.
O cuidado periódico tem uma função crítica: realizar a detecção precoce de hábitos de risco para desenvolver tumores antes que este já configure como doença estabelecida e disseminada.
Quando identificamos esses hábitos em estágios iniciais, as chances de cura são muito maiores. Todo câncer antes de seu estágio como doença orgânica, com tecido neoplásico, passa antes pelos estágios de desequilíbrios energéticos e funcionais. Nessa fase os exames de rotina costumam apresentar resultados normais, e muitas vezes não é nem possível fazer um diagnóstico nosológico, mas o corpo já dá sinais de que há algum desequilíbrio.
As queixas vão desde dificuldades mantidas e persistentes de se concentrar, para dormir, para se relacionar com pessoas, para lidar com os próprios pensamentos, para aguentar uma jornada normal de trabalho sem exigência física, até alterações no apetite/alimentação, na consistência e no aspecto de urina e fezes, pele, pelos e cabelo.
Simplificando em muito o linguajar teórico/técnico e na fronteira de campos da medicina que ainda começamos a estudar, é como se pudéssemos nos questionar: para onde está indo a energia que eu deveria ter?
Dessa forma considero fundamental chamar-lhes a atenção para alguns dos fatores de risco mais importantes no surgimento do câncer, assim como de abordagens práticas em seus manejos.
Tabaco
No combate ao vício, o que funciona?
Dentre diversas táticas e técnicas, destaque para três:
1. Cuidado com as emoções
Às vezes, um distúrbio de humor impede o indivíduo de abandonar o cigarro. Por isso, um diagnóstico adequado de saúde emocional faz toda a diferença.
2. Prescrição de remédios
Para quem é altamente dependente do fumo, adesivos e chicletes de nicotina podem não controlar a fissura. Há medicamentos mais capazes para indicar nessas situações assim como tratamentos com terapias alternativas como a acupuntura.
3. Substituição da memória
A pausa para o cigarro deve deixar de remeter a algo prazeroso. Existe a seguinte técnica: o paciente até pode fumar, desde que em pé, parado e diante de uma parede branca e ali permanecer. Assim vai “ensinando” seu cérebro que a recompensa não é tão boa assim.
Agentes infecciosos
São “inimigos invisíveis”. É importante chamar a atenção para cinco patógenos ligados ao câncer:
1. Papilomavírus humano (HPV)
Além do câncer de colo de útero, pode causar o de boca, pênis e ânus. O certo é se vacinar antes do início da atividade sexual — é possivel tomar a dose na rede pública.
2. Helicobacter Pylori ( pylori)
A bactéria é transmitida via alimentos contaminados e está por trás do câncer de estômago. Antes, pode ocasionar gastrite e úlcera. Vale investigar azia e dores.
3. Vírus da hepatite B
Eleva em 100 vezes o risco de câncer de fígado. É passado adiante por transfusões, sexo e de mãe para filho. A vacina existe desde 1982. Se não sabe se já tomou, é bom checar.
4. Vírus Epstein–Barr
É associado a tumores linfáticos. O contágio ocorre por meio da saliva. Pode provocar a mononucleose, a doença do beijo. Não há vacina, mas há prevenção.
5. HIV
O vírus causador da AIDS prejudica as defesas naturais de quem convive com ele. Como consequência, todos os outros agentes infecciosos acabam se tornando mais ameaçadores. Utilizar proteção nas relações sexuais e manter a imunidade em dia, com uma dieta saudável e praticar exercícios físicos, é indispensável para diminuir o risco de contrair outras infecções.
Álcool
As bebidas alcoólicas reúnem inúmeros elementos carcinogênicos, mas o etanol em si é o mais ardiloso. Ao ser absorvido no organismo ele é capaz de produzir radicais livres, que induzem oxidação e prejuízos ao DNA. Além disso, a sua degradação gera subprodutos que são tóxicos e podem danificar o DNA diretamente.
É importante esclarecer um famoso mito: embora o vinho tenha fama de benéfico por causa do resveratrol, os autores do guia de prevenção ao câncer da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC), publicado em 2020, calculam que, para cada câncer que tal substância venha a prevenir, outros 100 mil casos são promovidos pelo etanol. Para tirar proveito do resveratrol, melhor seria optar pelo suco de uva.
No combate ao vício o que funciona?
Dentre diversas táticas e técnicas, destaque para quatro:
1. Não existe compensação
Caso não tenha bebido de segunda a quinta-feira, não existe acúmulo de saldo para o fim de semana. Essa é uma narrativa que criamos para nos enganar.
2. Invista em outros hábitos
Se a bebida funciona como muleta para aliviar a ansiedade — algo mais comum durante a pandemia de coronavírus —, tente trocá-la por leitura, meditação, exercícios.
3. Procure ajuda
Ao notar dificuldade para maneirar nas doses, sentir culpa por ter bebido, começar a beber sozinho como um hobbie; busque ajuda. Há remédios para acabar com a fissura por álcool. A psicoterapia e a acupuntura também são fortes aliados nesse tratamento.
4. Conheça grupos de apoio
O Alcoólicos Anônimos, cujo método é baseado em 12 passos, é o mais famoso deles e tem altos índices de eficácia.
Alimentação
A fórmula geral de uma alimentação “anticâncer”:
1. Coma mais...
Frutas, verduras, legumes, cereais integrais, fontes de proteína vegetais (feijão, ervilha, arroz, lentilha) e oleaginosas (nozes, castanhas, amêndoas).
2. Coma menos
Carnes vermelha e processada, grãos refinados, bebidas açucaradas, doces, sal e itens ultraprocessados.
3. Café: pode ou não pode?
Aparentemente parece não existir prejuízo no consumo de até 4 xícaras de café expresso por dia, quantidade vista como segura por grande parte dos especialistas.
4. Suplementos vitamínicos
- Somos bombardeados diariamente com propagandas de que ingerir determinadas vitaminas e minerais pode nos proteger de desenvolver tumores.
- Contudo, os estudos são categóricos: os benefícios de consumir esses nutrientes por meio da comida superam de modo acachapante o consumo de multivitamínicos.
5. Mais feira e menos padaria
Procure frequentar mais a feira. Sim dá mais trabalho. Mas é extremamente melhor para a sua saúde do que consumir os alimentos tipicamente encontrados na padaria como pães, doces, bolos, tortas, etc. Não quer dizer que ir a padaria é proibido, mas que a frequência e quantidade desse tipo de alimento no seu repertório alimentar não deve ser alta.
Carcinogênicos na comida
No guia de combate ao câncer, a IARC dedicou um capítulo para abordar agentes nocivos específicos que podem ser encontrados nos alimentos, como a aflatoxina. Associada ao câncer de fígado, a substância é produzida por um fungo que costuma se proliferar no amendoim mal armazenado. Por isso, na hora da compra, é mais indicado dar preferência a produtos com o selo Pró-Amendoim.
Já as carnes processadas, representadas por salsicha e companhia, não inspiram elogios. As técnicas usadas na fabricação, como defumar e curar, geram compostos nitrosos e carbonetos aromáticos, considerados carcinogênicos. Do ponto de vista nutricional, esse grupo não oferece nada.
O que vale a pena saber na prática?
1. Nada de abusos
O Instituto Nacional do Câncer (INCA) indica restringir o consumo a 500 gramas por semana. Se for um bife médio, de 150 gramas, são três a quatro refeições de domingo a domingo.
2. Olho na temperatura
Priorize a versão ensopada, guisada ou assada. Se quiser grelhar, faça um pré-cozimento. Assim, o bife fica exposto a altas temperaturas por menos tempo.
3. Churrasco não pode ser rotina
Ele combina temperatura elevada e presença de carvão, um agravante, uma vez que as substâncias que dele se desprendem podem grudar na carne e possuem propriedades cancerígenas.
4. Caprichar no acompanhamento
Ao colocar o bife no prato, não se esqueça de incluir vegetais, como tomate, beterraba, cenoura, brócolis. Eles ajudam a reduzir a absorção dos carcinogênicos.
5. Carnes processadas: uma lista para evitar
Para cada 50 gramas desses produtos ingeridos na rotina, sobe 18% o risco de ter câncer colorretal. Evite sempre e o máximo possível: salsicha, salame, peito de peru, presunto e afins.
Sedentarismo e obesidade
Como se movimentar mais?
1. Frequência ideal de exercício
Não há fórmula exata para prevenir um tumor específico. Contudo, a última diretriz da Sociedade Americana do Câncer (ASC) indica de 150 a 300 minutos de atividade aeróbica moderada por semana ou 75 a 150 minutos de uma atividade vigorosa, mais intensa. Entre as crianças, o recomendado é uma hora por dia.
2. Misture as modalidades
Na diretriz da ASC, os autores assumem que faltam dados sobre a relação entre exercícios de força (musculação e pilates) e a prevenção do câncer. Ainda assim, as vantagens dessas atividades à saúde são indiscutíveis. Por isso, é aconselhado que sejam realizadas 2 vezes por semana.
3. Deixe a rotina mais ativa
De nada adianta virar atleta de manhã ou à noite e no resto do tempo ficar 8 horas por dia sentado trabalhando em casa (home office) ou no trabalho. Por isso, levantar-se mais durante o expediente é altamente recomendado.
Além disso, trocar a televisão (Netflix) por passeios ao ar livre (lembrar do uso de máscara), descer do ônibus um ponto antes (desde que em região segura), substituir o elevador pelas escadas, são algumas das táticas que podem parecer pouco no curto prazo, mas que vão se somando ao longo de semanas e meses até gerar um impacto relevante.
O ambulatório da AFPESP está de portas abertas, seguindo todos os protocolos e normas preconizados pelo Ministério da Saúde devido à pandemia da Covid-19, para atendê-los com todo cuidado e a atenção devida. Procuramos entregar o maior valor possível nas consultas e fazer valer o tempo e a energia dedicados a essa demanda. Contem conosco!
Dr. Raul Coelho Lamberti é médico acupunturiatra (especialista em Acupuntura e Medicina Tradicional Chinesa) e responsável técnico pelo Ambulatório da AFPESP. |