Por Silvana Tognini, conselheira
Segundo o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), o Ministério da Saúde do Brasil ignorou dispositivos legais, evidências científicas e apelos ao diálogo da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), do Conselho Nacional de Saúde (CNS) e de outras instâncias de controle social, ao instituir unilateralmente a Rede Materno e Infantil (RAMI), que dá ênfase à atuação do médico obstetra, sem contudo contemplar na linha do cuidado para a assistência em saúde das crianças e mulheres, os médicos pediatras e as enfermeiras obstétricas. Ocorre que, cerca de 830 mulheres no mundo, todos os dias, perdem suas vidas por causas evitáveis no ciclo gravídico puerperal; sendo que 99% de todas as mortes maternas ocorrem em países em desenvolvimento. (OPAS-OMS, 2010)
A mortalidade materna é um bom indicador da realidade socioeconômica de um país e da qualidade de vida de sua população. No mundo, a cada minuto, uma mulher morre durante o trabalho de parto ou por complicações na gravidez, e, no Brasil, esse problema atinge as várias regiões de forma desigual. (TOGNINI et al, 2011) Segundo o Boletim Epidemiológico do Ministério da Saúde do Brasil – Vigilância em Saúde, estima-se que ocorreram 59,1 óbitos maternos para cada 100 mil nascidos vivos no ano de 2018. Infelizmente a Razão de Mortalidade Materna - RMM tem se mantido elevada, distante de atingir a meta para redução das mortes maternas estabelecida para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030, de 30 óbitos de mulheres no ciclo gravídico puerperal para cada 100 mil nascidos vivos. (MS-SVS, 2020) Já a mortalidade infantil traz indicadores importantes sobre a saúde da população recém-nascida/crianças menores de 5 anos, bem como a mulher na gestação. (FADC,2019)
No Brasil a taxa das mortes infantis para cada mil nascidos vivos foi de 13,3 para o ano de 2018. De acordo com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), o Brasil necessita, até o ano de 2030, reduzir a taxa da mortalidade infantil para no máximo 05 por 1.000 nascidos vivos e a mortalidade na infância para no máximo 08 por 1.000 nascidos vivos. (FADC,2019) Ocorre que a Portaria MS 715/2022, desmonta a Rede Cegonha, sendo esta a mais bem-sucedida política pública de assistência ao pré-natal, parto e puerpério no Brasil, onde contemplava a equipe multiprofissional na linha de cuidado materno/infantil.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece e qualifica a atuação da Enfermagem Obstétrica e do Pediatra como profissionais essenciais e primordiais para a redução da mortalidade materna e infantil, bem como a atuação da equipe multiprofissional na área da saúde.
A garantia à vida das mulheres e crianças brasileiras, bem como a assistência em saúde humanizada e de excelência, devem ser consideradas invioláveis para um país e merecem total respeito e dedicação dos gestores públicos. Neste sentido, faz-se necessária imediata revogação da Portaria MS 715/2022, como garantia Constitucional e fundamental à saúde e à vida das mulheres e crianças do nosso país.
Silvana Tognini é enfermeira aposentada, Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina do ABC (FMABC), Doutora em Ciências pela Faculdade de Medicina da USP e associada AFPESP há mais de 20 anos. Atualmente, faz parte do Conselho Deliberativo.